Francesco Vignarca: uma paz abstrata e baseada em contratos não é paz
Vatican News com Agência Sir
Teve início em Munique nesta sexta-feira, 14 de fevereiro, a Conferência Internacional sobre Segurança, com a participação de sessenta chefes de Estado, especialistas políticos internacionais e militares para debater as relações entre a União Europeia e os Estados Unidos, despesas militares e, sobretudo, o início das negociações de paz na Ucrânia.
O encontro realiza-se no contexto das recentes iniciativas do presidente dos Estados Unidos Donald Trump com tratativas com a Rússia, com o objetivo de colocar um fim na guerra na Ucrânia. “Uma coisa é clara: no final das negociações deve haver uma solução de paz sustentável que proteja a soberania da Ucrânia e garanta que a Rússia de Putin nunca mais coloque em perigo a paz da Europa”, disse a ministra das Relações Exteriores da Alemanha, Annalena Baerbock, à margem da Conferência de Segurança de Munique.
E com as novas cartas colocadas na mesa, a Agência Sir pediu uma avaliação ao coordenador das campanhas da Rede Italiana Paz e Desarmamento, Francesco Vignarca.
“Se chamamos isso de ‘diplomacia’ - afirma ele - eu certamente não a chamaria de ‘diplomacia da paz’, pois acredito que os Estados Unidos, como sempre fizeram, estão apenas fazendo diplomacia a seu favor e ainda mais Trump que quer ter uma presença muito forte nos primeiros dias de sua posse”.
Vignarca observa que isso pode ser constatado pelo "tipo de propostas que estão sendo feitas. Elas passam por cima de qualquer situação relacionada ao direito internacional e acima da vontade dos povos envolvidos. Nesse sentido, é realmente equivocado pintar Trump como um pacifista. A paz, sabemos, não é apenas a ausência de guerra. É presença de direitos, é justiça. São soluções de longa duração. Trump, por outro lado, está apenas cuidando de seus próprios interesses. Certamente, o fato de parar os combates é de qualquer forma um aspecto positivo. Mas nós, do mundo da não violência, sabemos que esse não é o objetivo final. Pode ser um elemento base, mas não é o objetivo de uma paz que se pretende justa, duradoura e sobretudo a favor dos direitos dos povos”.
Deve-se fazer de tudo pela paz. Mas a que custo? Existe alguma regra básica a ser respeitada?
Tudo se perde com a guerra, nada com a paz, dizia Bento XV. Isso foi repetido recentemente pelo Papa Francisco e pelo cardeal Matteo Zuppi: a guerra é sempre uma derrota. A regra a ser sempre respeitada é aquela de respeitar os direitos das pessoas, a começar pelo direito à vida. É por isso que dizemos que a paz nunca pode ser construída por meio da violência. É o tema da paz positiva. Se colocarmos a paz dentro de um percurso de fortalecimento dos direitos das pessoas, muda a perspectiva e mudam também os instrumentos.
Quais são os riscos de uma paz baseada no papel e em contratos?
Uma paz abstrata, baseada em contratos não é paz. Já vimos isso no passado na Europa. Pensemos no que aconteceu entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, com os acordos feitos em Versalhes. Eles voavam acima das pessoas e dos povos e estavam vinculados aos interesses dos governantes. Infelizmente, eles se tornaram a base sobre a qual ocorreu a tragédia da Segunda Guerra Mundial. É óbvio que há o aspecto formal e diplomático dos acordos, mas esse elemento deve fazer parte de um caminho que dê força às comunidades e aos povos. Esta é a verdadeira paz. Aquela que nasce e se desenvolve quando os povos estão convencidos do que está acontecendo. Caso contrário, o risco é pensar que o aperto de mão de Putin com Trump e os acordos que eles fazem pelas costas de todos são uma forma de fazer as pazes e talvez esses personagens que nada têm a ver com pacifistas e pacificadores sejam exaltados.
Mas a União Europeia, onde está e por que não está lá?
Sobretudo aos olhos das pessoas que sofreram a morte e a destruição de suas comunidades, a União Europeia é a grande derrotada destes três anos. Não existe porque nunca teve a coragem de dar um passo a mais. Nas mãos de uma classe política que às vezes privada de visão, tornou-se um comitê de negócios. Corremos o risco de nos tornarmos um continente frágil, incapaz de se unir, superar as diferenças e construir uma frente comum. É preciso visão e, sobretudo, a força para recomeçar a partir do Manifesto de Ventotene e da Declaração Schuman, ou seja, dos princípios de base de uma Europa que se via forte porque estava livre do jugo da guerra, da militarização, do jugo de pensar o poder somente como poder econômico e militar.
Por onde se começa para fazer uma paz verdadeira, justa e duradoura?
De pessoas, de povos, de quem sofreu, de quem renuncia e rejeita a guerra. Temos muitos objetores na Rússia, na Ucrânia e Belarus. Mas sobretudo pela definição do que é a paz e dos parâmetros que a constroem. Frequentemente fala-se de interesses nacionais. Quais são? Quem os define? Começa-se a partir disso. As sociedades progrediram ao longo da história, tornaram-se mais democráticas e mais justas quando se uniram e tentaram entender o que era melhor para suas comunidades. Quando foram deixados de lado os slogans retóricos de alguns, elaborados apenas para promover os próprios interesses, e foram identificados os interesses da coletividade. E é isso que o Papa Francisco sempre enfatizou quando diz que sem justiça social, sem direitos para todos, sem cuidado com o meio ambiente, não se constrói a paz. Aqui, precisamos – para além de fatos concretos nos contextos de países em guerra – de uma reformulação global de um conceito global de paz.
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